Minha Vida de Escalador
por Edemilson Padilha*
Olá, pessoal! Fui convidado pelo pessoal do GPM a escrever um texto sobre algum tema de montanha. Como já escrevi muito sobre as minhas escaladas, resolvi mudar um pouco o foco e falar sobre o que me motiva e o que me faz ter sucesso nas empreitadas.
Meu nome é Edemilson Miqueleto Padilha, ou simplesmente Ed. Tenho 48 anos e faz 30 anos que comecei a escalar em rocha e fundei a Conquista Montanhismo. Desde que subi o Morro do Anhangava, aqui no Paraná, apaixonei-me pela natureza e pelas montanhas. E quando coloquei minha mão na pedra, aí lascou, não queria mais nada da vida!
Naquela época, 1990, equipamentos eram escassos e juntávamos mosquetões, fitas e alguma corda comprada em loja de ferragens para nos aventurarmos pelas paredes do nosso campo escola. Pegávamos vários ônibus para chegar até próximo ao morro e às vezes nem podíamos escalar devido à chuvarada. No inverno muito frio, as vias sempre desafiadoras, com proteções distantes, tudo isso foi fazendo com que ficasse mais preparado para enfrentar as grandes paredes.
O que sempre me motivou e me motiva até hoje foi desafiar meus próprios limites. Enfrentar algo que à primeira vista parece impossível. Fazer algo que nunca foi realizado por ninguém ou ir a locais em que nunca um ser humano colocou os pés. Porque tem lugares aqui na Serra do Mar Paranaense em poucas pessoas estiveram, menos que na lua talvez… Aí a gente, treina, treina com disciplina, fica com aquilo na cabeça. Enquanto treino sempre penso: estou aqui trancado treinando porque quero escalar o Fitz Roy, e aí consigo manter o foco. Pois, pra quem iniciou na escalada tradicional é difícil ter ânimo pra treinar em ginásio.
Outra coisa que faço é colocar uma foto da montanha ou da via que quero escalar bem à vista. Assim trabalho mais animado. Ou marco os dias da próxima viagem no calendário. Tudo isso faz com que a mente vá se preparando para o próximo desafio.
E o planejamento? Ah, isso é muito importante. Sempre faço uma planilha para especificar o que cada membro da equipe vai levar, de maneira que vamos combinando e anotando. Com os meios de comunicação atuais, é mais fácil de planejar qualquer coisa. Você pesquisa sobre o lugar e fala com alguém que já foi e já vai ter informações relevantes para planejar. Para ir repetir uma escalada é um pouco mais fácil, pois é só levar os equipamentos citados no croqui. Já quando vamos abrir uma via, aí temos de levar de tudo um pouco, pois não sabemos o que vamos encontrar pela frente.
Depois que já estamos treinados, ou seja, que já possuímos a técnica para enfrentar o desafio; já temos todos os equipamentos necessários para a empreitada; já sabemos qual a melhor época do ano para escalar no local; aí entra o ponto crucial (ou seria cruxial): a estratégia! Porque a estratégia diz respeito à maneira como se usará tudo o que temos nas mãos. Vou dar um exemplo. Em 1994 tentei escalar o Ibitirati, que é a maior parede do Paraná, com uns 600 metros de escalada. Na primeira empreitada, o clima estava instável e óbvio que choveu, pois aquele lugar é onde mais chove no mundo. Na segunda, resolvemos fazer a escalada em um só dia e ainda levamos pouca água. Obviamente sem sucesso, pois não tínhamos competência para escalar rápido e descemos da metade da parede. Na terceira, fomos leves, decidimos fazer em 2 dias, já tínhamos mais conhecimento sobre a montanha e conseguimos atingir o topo! Apesar da pouca experiência, de termos ido num final de semana bem quente, já fora da temporada, a estratégia correta fez com que tivéssemos sucesso. Por isso que o Mark Twight diz: “A Estratégia é mais importante que a Técnica, que por sua vez, é mais importante que o Equipamento”.
Atualmente, quando faço alguma escalada, mentalmente eu já a havia realizado. Meses antes, fico imaginando cada passo, cada parte da estratégia e da logística para tentar encontrar erros e também soluções. Desta maneira, já tive vários insights para solucionar problemas que tornaram viável um projeto.
Mas o mais importante nas escaladas de grandes paredes é ter bons companheiros. E nisso sempre tive muita sorte. E qual o segredo para encontrar bons parceiros? Primeiramente, temos de ser o melhor parceiro. Não importa se não escalamos bem, se não temos muita experiência, somos o melhor parceiro quando nos preocupamos com os outros e estamos atentos a tudo. Porque tem dias em que não estamos bem, às vezes nem conseguimos guiar, mas aí temos de ser o melhor segundo de cordada: dar segurança, prever as manobras, carregar mais peso, cuidar dos parceiros ou esperar os companheiros com a janta pronta.
Pra mim montanhismo se traduz em uma palavra: companheirismo. Sempre vou querer escalar para chegar no topo com os parceiros e comemorar e depois descer contar as histórias dos perrengues! Espero que tenham gostado das dicas! Cuidem-se muito, respeitem a montanha e cuidem de seus parceiros sempre! Grande abraço e boas escaladas!
*Edemilson Padilha, nascido em 1972, fundador da empresa Conquista Montanhismo. Três vezes ganhador do Prêmio Mosquetão de Ouro, mais importante do montanhismo nacional. Vencedor do Prêmio Go Outside como escalador do ano. Escalou montanhas imponentes, como Cerro Fitz Roy e Cerro Torre, na Patagônia e o Salto Angel, na Venezuela. Especialista em grandes paredes, participou da conquista alguns dos maiores paredões do Brasil, como a Pedra Riscada, Pedra Baiana, Fortaleza e da Lavra; além de mais de 200 vias no estado do Paraná, que é onde vive atualmente.