Da Arte de Compartilhar
De todas as atividades físicas que pratiquei (e confesso que não foram tantas), talvez a escalada seja a que mais produza, em mim, aprendizados, motivações e significados
Desde a minha primeira experiência em rocha até a última, na semana passada, minha corda sempre foi compartilhada com alguém do GPM. O primeiro contato foi na Pedra do Santuário (Pedra Bela – SP), em uma vivência de escalada do grupo, na qual ganhei alguns ralados e novos desafios físicos.
Estava posto o primeiro fator motivacional da prática. Quase não prestava atenção à paisagem ou ao cume. O processo físico da descoberta de se movimentar na parede, em me desafiar nas vias mais difíceis, era (e ainda é) o motor que me fazia (e ainda me faz) treinar constantemente.
Parte da escalada é um aprender a desaprender. Lidamos com nossos medos, nossas crenças. Nossa evolução depende em questionar alguns dos nossos limites físicos e psicológicos. Esse exercício de quebra de paradigmas me fascina, me motiva a continuar conhecendo novas vias e locais de escalada.
Após o meu CBM, em 2017, continuei escalando e fiz grandes amizades no grupo. Talvez esse seja o segundo elemento motivador da prática. A escalada é um esporte coletivo. Salvo algumas exceções, sempre precisamos de um assegurador, um parceiro que garanta a nossa integridade física. E, nessa relação de confiança, acabamos por dividir nossos medos, conquistas e alegrias.
Nunca imaginei que, após os meus 40 anos, fosse possível fazer novas amizades com tantas afinidades. Hoje, tenho ao meu lado escaladores que considero velhos novos amigos. E sei que vou levá-los comigo daqui para frente, seja na rocha ou na vida.
Em nosso grupo, temos alguns escaladores com bastante experiência, que, muitas vezes, abrem mão de alguns finais de semana para atuarem como voluntários em nossos cursos.
Como aluno, por vezes cheguei a me perguntar qual seria a motivação de um instrutor que, após uma semana dura de trabalho, se disponibiza em levar alunos em vias em que já escalou inúmeras vezes. Não são atividades fáceis: exigem atenção à segurança do aluno, paciência e tempo.
De aluno me tornei monitor e, depois, instrutor de escalada do GPM. Comecei a repetir o trabalho dos meus veteranos, o de dividir a ponta da corda com novos alunos. Este ano, após um hiato de 2 anos sem cursos, tive a oportunidade de levar dois aspirantes a escaladores na via Cresta, na Pedra do Baú pelo CBM (Curso Básico de Montanhismo).
As reações espontâneas deles (gritos, brilhos nos olhos, palavrões e gargalhadas) me fez entender o grande prazer que é dividir esse esporte com pessoas que nunca ou que pouco tiveram contato com a prática. Além do desafio físico e das grandes amizades, o que me motiva a escalar é o ato de compartilhar: ensinar, aprender, confiar e confraternizar. E, talvez, seja esse o grande motivo pelo qual somos todos voluntários do GPM.
Enquanto isso, continuo escalando sem olhar direito a paisagem… Acho que a escalada ainda me reserva novas descobertas.
Akira Takiy, julho de 2022